Wellington Barbosa
Eu havia acabado de chegar de uma série de conferências que estava realizando em uma de minhas igrejas quando o telefone tocou. Geralmente, quando um pastor distrital recebe uma ligação tarde da noite, a mente já entra em estado de alerta, aguardando alguma notícia ruim. Do outro lado da linha, uma jovem em desespero me pediu: “Pastor, por favor, precisamos de sua ajuda. A Mira (pseudônimo) está endemoniada!”
Embora a informação fosse preocupante, não era surpreendente. Em duas outras ocasiões, Mira havia manifestado um comportamento compatível com o estado de possessão. Em ambas, não pude me fazer presente por estar em viagem. As pessoas que haviam testemunhado as manifestações ficaram impressionadas e acreditavam que a causa era espiritual. Ao visitá-la após cada uma das ocorrências, eu não tinha certeza do que pudesse ser. Porém, naquela noite, seria diferente. Quando compartilhei a situação com minha esposa, ela se dispôs a me acompanhar até a casa daquela garota.
O quadro era assustador. Apesar de ser uma adolescente de aparência frágil, manifestava grande força. Ela gritava e dizia palavras desconexas, enquanto um de seus irmãos, um rapaz forte, tentava contê-la, repetindo freneticamente a frase: “O sangue de Jesus tem poder!” Eu nunca havia testemunhado algo daquela natureza.
Começamos a cantar alguns hinos e ler textos da Bíblia que exaltavam o poder divino sobre as hostes malignas. O tempo parecia transcorrer lentamente, mas, aos poucos, Mira foi se acalmando, até que, exausta, adormeceu. Enquanto ela dormia, comecei a conversar com o irmão dela a respeito do que havia acontecido.
Em Cristo há libertação plena para quem foi aprisionado pelo diabo
A família enfrentava uma série de problemas, e a garota estava passando por acompanhamento psiquiátrico. Quando soube disso, perguntei a respeito do tratamento, ao que ele me respondeu: “Ela não tem seguido as orientações médicas…” Essa informação foi a chave para me ajudar a conduzir o aconselhamento posterior.
A partir desse momento, fiz algumas visitas à família e ressaltei a importância do cuidado médico, somado ao acompanhamento pastoral. Coincidentemente, durante o período em que permaneci naquele distrito, Mira não teve nenhum outro surto semelhante àquele. Ao que tudo indica, tratava-se de um problema psiquiátrico superado com uma abordagem multidisciplinar.
Penso que esse relato ilustra as diferentes atitudes em torno de comportamentos que ocorrem no limiar entre o natural e o sobrenatural. Para alguns, toda manifestação incomum é obra do maligno. Outros, porém, ignoram por completo a dimensão espiritual e racionalizam esse tipo de ocorrência. Contudo, precisamos estar atentos para algumas realidades: (1) vivemos em um grande conflito entre os agentes do bem e as instrumentalidades do mal; (2) nem todos os surtos são reflexos da intervenção satânica, mas isso pode ocorrer quando alguém abre as portas para influências malignas; (3) à medida que nos aproximamos do fim, Satanás será mais ativo em demonstrar sua presença por meio de diferentes graus de despersonalização do ser humano; (4) em Cristo há libertação plena para quem foi aprisionado pelo diabo; e (5) precisamos nos manter vigilantes em comunhão com Deus para não sermos vítimas das armadilhas satânicas.
Conhecer o contexto espiritual em que vivemos, estar atentos ao potencial de dano do inimigo, reconhecer a onipotência divina e nos manter revestidos com a armadura de Deus (Ef 6:10-18) são elementos fundamentais no cenário do grande conflito. Nessa guerra inevitável e prestes a terminar, devemos crer que nenhuma arma forjada contra nós prosperará, porque o Senhor é a defesa de Seus filhos (Is 54:17). 
WELLINGTON BARBOSA é editor da Revista Adventista
(Editorial da Revista Adventista de novembro/2025)


